Palmatória, como instrumento de intermédio no processo de ensino/aprendizagem da arte
2010-03-10 18:26
"Quem ensina, ensina alguma coisa, para alguém, por algum motivo"
O castigo físico em crianças foi introduzido no Brasil pelos padres jesuítas no século XVI, causando indignação nos indígenas, que repudiavam o ato de bater em crianças. A correção, como explica a historiadora Mary Del Priore, no livro História das Crianças no Brasil, era considerada uma forma de amor. O excesso de carinho devia ser evitado porque fazia mal aos filhos. A relação entre os pais e suas crianças teria de ser o espelho do amor divino, segundo o qual, amar é castigar os erros e dar exemplo de vida correta. Os castigos disciplinares devem ser aplicados não apenas para corrigir as chamadas ‘malcriações’ e ‘birras’ como também serve para sacudir a preguiça que é considerada culpada de muitos erros e ignorâncias desde cedo no espírito da criança.
A perspectiva judaico-cristã sempre foi favorável por uma educação por meio de castigos físicos. A historiadora comenta que "a partir da segunda metade do século XVIII, com o estabelecimento das chamadas aulas régias, a palmatória era o instrumento dessa época, dirigido aos professores”.
“Ao expulsar os jesuítas de Portugal e de suas colônias, em 1760, o Marquês de Pombal pôs fim à principal forma de educação vigente no Brasil. Segundo o pesquisador Luiz Kelly Martins dos Santos, a Reforma Pombalina foi catastrófica porque era um plano político, não pedagógico."O alvará assinado pelo rei de Portugal e aplicado no Brasil (seria precursor da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira) introduziu normas punitivas a professores e alunos - nestes últimos, podia-se aplicar castigos físicos como palmatória e ajoelhar-se no milho"
A palmatória tornou-se um símbolo de disciplina na educação da geração do Brasil Colonial. Mas foi ainda muito usada depois da Independência. Era comum nas formaturas de fim de ano os alunos presentearem os professores com palmatórias feitas de madeira compensada ou papelão, como forma de mostrarem submissão à autoridade.
No estudo de Michel Foucault (1977) o uso do castigo físico faz parte de um sistema de controle de uma sociedade investida do sentido da ordem e da lei. A vigilância enreda a todos, e não apenas as crianças. As instituições do século 18, ligadas por uma espécie de ‘rede’ de crenças, valores e hábitos, geraram um sistema de vigilância, controle e punição desde a família, até prisão, passando pela escola ou serviço militar. A educação tradicional era autoritária porque podia impor, todo o seu saber e poder para “torcer o pepino desde pequeno”. Era um sistema educativo que acreditava ser preciso formar um cidadão “disciplinado” para ser “dócil” a nova ordem moderna. Mas em nossa época denominada pós-moderna querer resgatar o castigo físico como método educativo, além de ser um contra-senso é uma prática fora de lugar. Os pais que ousam bater nos filhos, no fundo, carecem de palavras e de espírito democrático. Funcionam como o terrorismo que através de seu ato – bruto, rude, bárbaro - pretendem eliminar o sentido das palavras e o valor do diálogo na construção do verdadeiro sujeito. Mais ainda, eles acreditam que são donos do corpo dos filhos assim como era o senhor de escravos; alguns professores ainda vivem no mundo delirante dos anos 70, acreditando que podem dirigir os corpos, os corações e o futuro dos seus alunos. O ato de bater reforça, sem dúvida, o autoritarismo e sadismo do mais forte sobre o mais fraco, no caso, a criança, termina ficando ressentida e com raiva. Existe suspeita de que o ato de bater pode levar o agressor a uma compulsão à repetição, isto é, a adquirir prazer e gozo sádico em bater.
À partir do texto acima e do livro do Foucault (FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão.) questionar e discutir com os alunos sobre metodologias usadas como forma de agressão, e como a palmatória influenciava como instrumento intermediário no processo de ensino.
Vivemos numa época de crise de paradigmas, inclusive no campo da educação. Ninguém tem a verdade e existe confusão quanto qual a melhor maneira de educar.
Equilibrar palavras e atos assertivos, sem recorrer o uso de violência física, é fazer da educação uma arte e nova ética para uma nova geração que poderá ser mais democrática e mais feliz.
Referência Bibliográfica:
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução de Raquel Ramalhete, Petrópolis: Vozes, 2002.
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